sexta-feira, 15 de abril de 2011

A mulher medieval de hoje


A ideologia predominante na Idade Média é a da religião Cristã. É o poder eclesiástico que exerce toda a influência sobre a vida dos homens. Até mesmo os reis devem obediência ao Papa. As opiniões são submetidas ao que estabelecem as normas de vida cristã.

A doutrina cristã tem como fundamentação a Bíblia, o livro que representa o grande marco da literatura mundial. Todas as crenças, ideologias e normas pertencentes ao mundo cristão possuem como base os ensinamentos bíblicos.
Um dos relatos bíblicos mais conhecidos pela humanidade é o da criação do mundo e do homem. O Deus bíblico cria o mundo em sete dias. No sexto dia, o homem é criado, moldado de barro pelas mãos do próprio Deus em pessoa. Este boneco de barro teria sido moldado de forma semelhante ao homem divino, que sopra em suas narinas a vida.
Após criar o homem à sua semelhança, a narrativa conta que Deus pensa em formar uma criatura que sirva de companhia para aquele ser que havia sido feito à sua semelhança. Seria um ser que serviria e ajudaria o homem, prestando-lhe auxílio. Esta ideia de que a mulher fora pensada para auxiliar o homem conduz o pensamento humano a entender a mulher como um ser inferior, humildemente servil, uma auxiliadora, com senso maternal, de cuidado para o homem. A partir desta concepção da mulher como auxiliadora, não cabe pensar nela como participante ativa da vida social. Ela deve permanecer em casa, limpando, cozinhando, lavando, parindo e criando os filhos, em silêncio perante a sociedade, proporcionando conforto ao homem, que assim se sente livre para sair e realizar trabalhos como a vida clerical, a filosofia, a política, o direito, o comércio, a medicina etc.
A narrativa de Adão e Eva ainda relata que, depois de ter sido criada para auxiliar e ser a companheira do homem, a mulher sofre o assédio da serpente que teria incorporado o maligno, o diabo. Tentada pela ideia de adquirir o poder do conhecimento pleno, ela aceita experimentar o fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal, colocada pelo ser divino, no meio do jardim, como forma de testar a fidelidade do casal.
A partir desse relato, a mulher, que já ocupa a posição inferior de auxiliadora do homem, é tida também na concepção de tentadora, pecadora, fácil acesso do diabo para influenciar a humanidade, a que trouxe o fim do paraíso do Jardim do Éden, a que desobedeceu a Deus e influenciou pela sedução o seu companheiro, Adão, a pecar.
Nesta concepção, a mulher tem o caráter corrompido e corruptor. A sua forma física recebe o peso de representar a tentação, o pecado, o desejo sexual. Este desejo torna-se pecaminoso, impuro, algo a ser evitado. Os conceitos de sexualidade e prazer são aliados aos de impureza e lascívia. A mulher representa a tentação do sexo. A tentação de Eva é imediatamente associada ao sexo. O fruto oferecido pela serpente é tida como sendo uma maçã e esta fruta passa a simbolizar a tentação do sexo.
Após caírem em pecado, Adão e Eva são expulsos do Jardim do Éden, lugar que representa a pureza original, o mundo sem pecado, morada do homem semi-divino. Tornando-se pecadores, os homens perdem a condição semi-divina e precisam deixar o lugar santo, recebendo mais punições.
A partir de então, a mulher sofre dores de parto, cuida da casa, cria os filhos, é um ser inferiorizado em relação ao homem, a quem deve servir. O homem, mantenedor, protetor, forte, deve trabalhar fora para sustentar a família. É uma punição-prêmio. Ele trabalha e sustenta, realizando-se social e culturalmente. A mulher trabalha unicamente para auxiliar aquele que a sustenta, de quem ela depende para sobreviver.
Quando uma criança nasce, o seu futuro já é, em parte, determinado pela sua condição de menino ou menina. Se for menina, deve aprender a cozinhar, limpar, cuidar de uma casa e educar crianças, além de se manter preocupada com os atrativos físicos, pois a sua única esperança de vida concentra-se no casamento, já que a sua condição feminina implica a dependência de um mantenedor necessariamente masculino que a possua.
Nos fins da Antiguidade Clássica, a mulher exercia funções sociais relevantes. A própria mitologia clássica aponta mulheres em posições de grande destaque. Deusas olímpicas eram uma forte influência. Na Grécia, Athena, em Roma, Diana, no Egito, Ísis, entre outras. Mulheres fortes, sábias, de grande valor e influência perante a sociedade. Com a ascensão do Cristianismo, todas essas influências femininas foram sendo julgadas como perniciosas para a sociedade. A ideia de uma mulher sábia, forte, independente e sem marido passa a ser vista com grande preconceito.
Com a finalidade de coibir a filosofia de uma cultura politeísta e superar os hábitos da Antiguidade, era necessário que as mulheres fossem reduzidas à condição imposta pelo novo poder religioso. A filosofia antiga permitia a inclusão de mulheres no mundo do saber. Exemplo disso é a filósofa Hipátia, de Alexandria, que ensinava e tinha elevado prestígio entre os estudiosos. Recentemente, sua história foi contada no filme Ágora, que vale a pena assistir. Esta mulher de grande sabedoria foi brutalmente assassinada em nome da ideologia cristã de que a mulher não deve falar, mas ser submetida a uma vida doméstica inferiorizada. Observe o que se fala sobre ela:

Havia em Alexandria uma mulher chamada Hipátia, filha do filósofo Téon, que fez tantas realizações em literatura e ciência que ultrapassou todos os filósofos da época. Tendo progredido na escola de Platão e Plotino, ela explicava os princípios da filosofia a quem a ouvisse, e muitos vinham de longe receber os ensinamentos. Sócrates, o Escolástico, em ' História Eclesiástica' (Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Hip%C3%A1tia, no dia 11/04/2011, às 15h30).

As mulheres modelo, para o cristianismo, são Eva, por um lado, e Maria, seu oposto. Eva representa a sedução, a tentação, o pecado. Maria, como mãe de Jesus, ocupa uma posição de santidade, mas não como uma mulher independente. Ela gera o Filho de Deus, mas para isso não se “contamina com o pecado” do sexo e tem um marido que a perdoa pela gravidez inesperada. Ela é mãe acima de tudo, não decide, não determina, apenas obedece e dá exemplo de submissão à vontade do modelo de homem, masculino e divino.
Assim, a Idade Média espera que a mulher seja linda, casada, pura, submissa, mãe, dona de casa, viva em silêncio, não decida nada, não determine nada, não ensine, mas apenas obedeça ao que o homem determina, seja o seu pai, o seu marido, o seu irmão, o seu filho etc, e que apenas transmita a ideologia predominante, sem pensar e sem influenciar os filhos a se desviar das normas estabelecidas.
Infelizmente, em pleno século XXI, o mundo não empreendeu mudanças quanto ao modo de pensar a mulher. A mídia transmite a ideia de que a mulher deve ser linda e casada, submetida às vontades masculinas. Os estereótipos de beleza são estabelecidos com rigor e a grande maioria das mulheres faz questão de seguir as tendências, por mais que sejam difíceis. Horas e horas semanais em salões de beleza ou em casa fazendo um cabelo liso que a mídia estabelece ser obrigatório. É preciso agradar aos homens e conseguir a sua aprovação. E a mídia diz que para agradar aos homens é preciso que o cabelo seja liso, o corpo seja moldado de acordo com o padrão e a roupa seja a que as celebridades estão usando. O brasileiro investe mais em roupa que em conhecimento. A tentação do conhecimento pleno expulsa a mulher do paraíso que, aliás, é para muitos um lugar cheio de mulheres para servir aos caprichos sexuais do homem. 
A mulher que não tem um homem recebe uma carga de discriminação cruel. A necessidade de se afirmar como mulher casada exclui a mulher do mundo do saber, do mercado de trabalho, como Hipátia foi morta por insistir em ensinar livremente, em vez de casar com um cristão.
         Os jornais falam de mulheres de destaque, mas não destacam a sua formação intelectual. A noiva do príncipe Willian não pensa, ela veste determinada roupa e usa determinado corte de cabelo, é o que importa saber sobre uma mulher. A esposa do presidente Obama acertou nas roupas que usou na sua vinda ao Brasil, não interessa a sua opinião sobre outro assunto. A mulher é mencionada na mídia apenas como objeto que embeleza o mundo e traz conforto ao homem, mas poucas mulheres parecem estar insatisfeitas com isso.
Gente, tudo bem que beleza seja importante, mas não é tudo. Não pode ser tudo o que uma mulher tem para oferecer! Precisamos querer mais de nós e nos interessar mais  pelo que as mulheres de destaque na mídia têm para ensinar além de como se vestir.

2 comentários:

Debora Mota disse...

O verdadeiro cristianismo fala em igualdade entre os sexos, entre todos os seres humanos. Na história, Eva foi criada porque Adão não tinha ninguém igual a ele. Ela foi criada para ser alguém IGUAL a ele.
Foram os homens, literalmente os homens, os machos, que deturparam o ensinamento inicial. E as mulheres aceitaram. Também há desde sempre, repressão e opressão machista no mundo oriental não cristão. Esse é um problema humano; não bíblico.
Eu acredito que atualmente, as maiores responsáveis pela alienação feminina é a própria mulher. É claro que esse é um problema histórico, os que as mulheres são hoje não foi inventado hoje, mas elas tem hoje a maior parcela de culpa, justamente por aceitar o estigma e reforçá-lo em suas atitudes.
Pena! Fazer o quê? Colocar todas as mulheres frutas no liquidificador em potência máxima seria um bom começo. Hehehe

Késia Mota disse...

Realmente o problema do machismo não é do texto bíblico. Foi a interpretação dada a ele durante toda a Idade Média que conduziu a humanidade ocidental até hoje a entender as coisas como eu descrevi no texto. Se a narrativa tivesse sido interpretada de forma justa, a ideia da mulher inferiorizada não teria sido divulgada tão veementemente e não estaríamos sofrendo as consequências.

Ai ai

Colocar as mulheres frutas no liquidificador é uma boa ideia. kkkk